Autismo – Pesquisas com canabinoides

 Transtorno do espectro autista (TEA) é um termo usado para classificar uma série de desordens complexas de neurodesenvolvimento caracterizadas, em níveis diferentes, por dificuldades de interação social, problemas de comunicação verbal e física, e padrões de comportamento limitados e repetitivos. Entre uma variedade de tipos de TEA se encontra o autismo, a forma mais grave da desordem, também chamado de “TEA clássico”. Outros tipos incluem a síndrome de Asperger, o Transtorno Desintegrativo da Infância e Transtorno Global do Desenvolvimento, não especificados. De acordo com o Instituto Nacional de Transtornos Neurológicos e AVC, uma em cada 88 crianças com idade de 8 anos apresenta algum grau de TEA, sendo quatro vezes mais comum em meninos do que meninas.

Prejuízo da interação social é o principal sinal de TEA e pode ser observado desde a infância. Crianças e bebês diagnosticados podem ser indiferentes, evitar contato visual ou não responder quando chamados pelo nome. Eles podem focar em um objeto por longo período de tempo sem perceber qualquer estímulo externo. Eles têm dificuldades na interpretação dos pensamentos e sentimentos de outras pessoas e, assim, apresentam problemas para entender e responder a sugestões sociais, como expressões faciais e tom de voz. É comum demonstrarem falta de empatia. Movimentos repetitivos como rodopios, ficar se balançando ou comportamentos autoabusivos, como morder e bater a cabeça, são comuns em crianças com autismo.

Os primeiros indicadores de TEA incluem ignorar quando são chamados, pouco contato visual, não balbuciar ou apontar no primeiro ano de vida, nenhuma palavra aos 16 meses, alinhamento obsessivo de brinquedos ou outros objetos e não sorrir ou interagir socialmente. Indicadores posteriores incluem dificuldades em iniciar ou manter um diálogo, em fazer amizades, linguagem repetitiva ou incomum, dificuldade de brincar com a imaginação, padrões restritos de foco e a necessidade inflexível de seguir rotinas.

As causas do TEA ainda são desconhecidas, mas aparentemente tanto a genética quanto o ambiente desempenham um papel, de acordo com o Instituto Nacional de Transtornos Neurológicos e AVC. Irregularidades no cérebro e níveis anormais de neurotransmissores são comumente observados em crianças e bebês com TEA, o que sugere que a doença é causada por uma perturbação no desenvolvimento normal do cérebro devido à presença de defeitos nos genes que regulam a comunicação entre neurônios.

Atualmente não existe cura para o TEA, desta forma, os tratamentos tradicionais tem como foco o treinamento direcionado a ensinar habilidades sociais e de linguagem, medicação para ansiedade, depressão ou comportamentos obsessivo-compulsivos.

Descobertas: efeitos da canabis no autismo

Pesquisadores descobriram o que acreditam ser um possível vínculo entre o autismo e os receptores canabinoides, em particular os CB2 do sistema endocanabinoide 2,5,7,9. Um estudo descobriu que as mutações celulares no cérebro que haviam sido associadas com o autismo bloqueiam a ação das moléculas que agem nos receptores CB2. Estes são os mesmos receptores que interagem com os canabinoides da canabis – THC (tetraidrocanabinol) e CBD (canabidiol) 3. Um estudo semelhante descobriu ainda que camundongos com problemas comportamentais semelhantes ao do autismo possuíam receptores CB2 superativados 8. Outro descobriu esta mesma prevalência na superativação dos CB2, porém em humanos 11. Estas descobertas relacionadas aos receptores CB2 apoiam a teoria de que o autismo poderia ser causado por uma interrupção da habilidade do cérebro de enviar sinais claros, sugerindo assim a possibilidade de se usar os canabinoides encontrados na canabis para restabelecer a comunicação, permitindo um funcionamento celular normal 3.

Existem ainda evidências que apoiam a eficácia dos canabinoides no tratamento do autismo 7,9,10. Em um estudo, uma criança autista que recebeu THC por seis meses relatou melhorias significativas na hiperatividade, letargia, irritabilidade, estereotipia e problemas na fala 6. Além disso, camundongos com características comportamentais semelhantes a de humanos autistas apresentaram uma redução na depressão e foram capazes de permanecer focados correndo em uma roda giratória após administração de canabinoides 8. Outro estudo descobriu que o aumento de canabinoides no cérebro ajuda a remediar problemas de comportamento relacionados à síndrome do X frágil, a causa genética conhecida mais comum do autismo 4.

Estudos sobre os efeitos da canabis no autismo

  • Uma criança autista que recebeu THC por seis meses apresentou uma redução significativa dos sintomas da doença. Uso de dronabinol (delta-9-THC) em autismo: um estudo de caso prospectivo individual em autismo infantil.
    http://www.cannabis-med.org/data/pdf/en_2010_04_1.pdf
  • Camundongos com características comportamentais semelhantes a humanos com autismo demonstraram uma redução importante na depressão e conseguiram se manter focados na tarefa de correr em uma roda giratória. Consequências da interrupção do sistema monoaminérgico e canabinoide em um modelo de transtornos do espectro autista em camundongos.
    https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3137184/

Referência:

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